O presidente da SBH-Sociedade Brasileira de Hansenologia, Claudio Salgado, participou, na última quarta-feira 21, 18h, de live que falou sobre a queda no número de diagnósticos de hanseníase no Brasil em decorrência da pandemia de COVID-19. O debate foi promovido pelo Morhan-Movimento de Reintegração das Pessoas Afetadas pela Hanseníase e seus Familiares.
Entre os debatedores, a enfermeira coordenadora do Programa Estadual de Controle da Hanseníase da Secretaria Estadual de Saúde do Maranhão, Maria Raimunda Mendonça, e o fisioterapeuta do Ambulatório Especializado Regionalizado em Hanseníase de Alta Floresta/MT, coordenador do Morhan Núcleo Alta Floresta/MT, André de Brito. A live foi mediada pelo coordenador nacional do Morhan, Artur Custódio, e vice-coordenador Faustino Pinto.
A queda no número de diagnósticos está apontada inclusive no Boletim Epidemiológico da Secretaria Especial de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde. O documento relata que “a epidemia de Covid-19 influenciou o diagnóstico e o acompanhamento dos casos de hanseníase no Brasil”. Foram cerca de 28 mil casos notificados em 2019 para menos de 14 mil em 2020. Antes da pandemia, a SBH já estimava, inclusive em artigos científicos, que o Brasil teria de três a cinco vezes mais casos da doença.
Como o Brasil é o segundo país com mais casos de hanseníase – fica atrás da Índia, que ocupa o primeiro lugar no ranking mundial –, a SBH defende que a política de enfrentamento promova capacitação de profissionais da atenção básica à saúde para diagnosticar os casos ocultos. “Os sistemas de saúde público e particular não diagnosticam precocemente a hanseníase, mas a SBH está denunciando, há anos, uma endemia oculta da doença no Brasil por causa dos números preocupantes de diagnósticos tardios; ou seja, muitos casos de pacientes notificados já com grau 2 de incapacidade física e sequelas irreversíveis por hanseníase”, alerta.
Segundo Salgado, professor titular da Universidade Federal do Pará e doutor em Imunologia da Pele pela Universidade de Tóquio, são pacientes que passaram, por muitos anos, por serviços de saúde com histórico de dores pelo corpo, manchas na pele por hanseníase, perda ou diminuição de sensibilidade à dor, temperatura e mesmo ao toque e nunca tiveram o diagnóstico da doença, que exige treinamento e é um diagnóstico clínico.
O paciente com hanseníase segue transmitindo para seus contatos e somente após iniciar tratamento é que deixa de transmitir o bacilo causador da doença para pessoas saudáveis.
“Se antes da pandemia o número de diagnósticos no país já era alto, mesmo considerando a situação de subdiagnóstico que vivemos e a endemia que se agrava silenciosamente, a situação piorou muito com a pandemia. Além disso, as ações de capacitação e treinamento pelo país, principalmente em regiões periféricas, pobres e de difícil acesso, foram interrompidas. Já sabemos que nos locais em que há capacitação das referências em saúde, o número de diagnósticos aumenta sensivelmente”, alerta Salgado.
“Já antecipávamos o subdiagnóstico de casos em 2020. A falta de uma política pública de enfrentamento à pandemia de COVID-19 nacionalmente organizada, que resultou no catastrófico número de mortes que apavora a população brasileira, também afetou o controle de outras doenças, desorganizando, ou até mesmo impedindo, o acesso ao diagnóstico e tratamento”, diz Artur Custódio.
Denúncia
O presidente da SBH ainda fez uma denúncia: “Além da queda no número de diagnósticos em decorrência da pandemia, muitos casos deixaram de ser notificados por falta de medicação, já que a distribuição do coquetel de tratamento da hanseníase ao Brasil pela OMS vem falhando, com muitas denúncias por parte de pacientes e profissionais de saúde em vários lugares no país”. No ano passado, a SBH e também o Morhan fizeram várias denúncias, oficializando Ministério da Saúde, Organização Pan-americana de Saúde e Organização Mundial de Saúde sobre a escassez de medicamentos. O caso foi denunciado ao ministério Público Federal, no Rio de Janeiro, e segue no âmbito da Justiça para apuração.
“Enquanto isso, se a transmissão da hanseníase no país é alta – e isso em qualquer região brasileira –, agora, os pacientes que tiveram tratamento interrompido voltam a transmitir a doença, sem contar os danos à saúde que podem ser severos, com agravamento do quadro geral de saúde, das sequelas e consequente afastamento temporário ou permanente do trabalho, comprometendo gravemente a qualidade de vida dessas pessoas”, finaliza o presidente da SBH.
“A busca ativa de novos casos, o diagnóstico precoce e a garantia de tratamento são pilares do processo de controle da hanseníase. E todos esses pilares foram duramente atingidos em 2020: ao invés de busca ativa, tivemos impedimentos ao acesso aos serviços de saúde; ao invés de diagnóstico oportuno, tivemos subdiagnóstico; e ao invés de garantia de tratamento, tivemos a falta gravíssima de medicamentos que impediu tanto o início do tratamento de pessoas recém diagnosticadas como colocaram em risco o tratamento de pessoas que já estavam tomando a medicação, muitas das quais precisaram retomar seus tratamentos do início”, comenta Custódio.
Desde o início da pandemia, o Morhan vem promovendo uma série de lives com especialistas e artistas a fim de orientar a população, apoiar as vítimas da doença e alertar autoridades sobre o tema. A live desta quarta-feira teve a participação da cantora, compositora e estudante de Psicologia do Ceará, Samara Lopes. (Com informações da Texto & Cia – 20.04.21)