Pesquisadores da Faculdade de Medicina de Stanford (EUA) desenvolveram uma técnica diagnóstica que usa amostras de sangue para distinguir se uma infecção é viral ou bacteriana, com rapidez e com precisão de 90%, padrão recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O método mede a expressão de certos genes envolvidos na resposta imune do hospedeiro – como o sistema imunológico do paciente está reagindo – para identificar o tipo de infecção.
“O sistema imunológico faz isso há milhões de anos, aprendendo constantemente o que é bactéria, o que é vírus e como responder a ele. Ao invés de procurar o problema em si, podemos perguntar ao sistema imunológico”, explica Purvesh Khatri, PhD, professor associado de Medicina e Ciência de Dados Biomédicos em Stanford e autor sênior do artigo.
O estudo da equipe de Stanford usou dados de expressão gênica disponíveis publicamente de 35 países e compreendeu 4.754 amostras de pessoas de várias idades, sexo e etnias diferentes que apresentavam infecções conhecidas. De acordo com os pesquisadores, a diversidade de pacientes, infecções e tipos de dados é a mais representativa do mundo.
Utilizando aprendizado de máquina (machine learning) e metade das amostras, foi possível identificar oito genes que são expressos de maneira diferente em infecções bacterianas em comparação com as virais. Os resultados foram validados nas amostras restantes e em mais de 300 novas amostras coletadas no Nepal e no Laos.
Os oito genes permitem distinguir infecções bacterianas intracelulares e extracelulares das virais, com 90% de sensibilidade e 90% de especificidade. Segundo Khatri, é o primeiro teste a atender os padrões propostos pela OMS e pela Foundation for Innovation New Diagnostics (FNDI), organização sem fins lucrativos de alcance global.
“Mostramos que essa assinatura de oito genes tem maior precisão e mais generalização para diferenciar os tipos de infecções, independentemente de serem intra ou extracelulares, se o paciente vive em um país desenvolvido ou em desenvolvimento, se é homem ou mulher, se é criança ou tem 80 anos”, afirma Khatri.
Purvesh Khatri diz que o método desenvolvido em Stanford não é único porque existe um grupo de exames diagnósticos que analisam a resposta imune do hospedeiro. Esses testes podem distinguir infecções bacterianas extracelulares de infecções virais com precisão superior a 80%, mas só conseguem diferenciar de 40% a 70% quando se trata de infecções bacterianas intracelulares.
Segundo Khatri, essa “safra” de testes foi projetada usando dados da Europa Ocidental e da América do Norte, e não leva em consideração os tipos de infecções predominantes em países de baixa e média renda. Isso significa que têm dificuldade para detectar as diferenças mais sutis que existem entre as infecções bacterianas intracelulares e as virais.
Epidemiologicamente, as infecções bacterianas nos países desenvolvidos geralmente são de bactérias que se replicam fora das células humanas, como a E. coli e as responsáveis por problemas na garganta. Nos países em desenvolvimento, as infecções mais comuns – como tifo e tuberculose – são causadas por bactérias intracelulares, que se replicam dentro das células, como fazem os vírus.
Ele espera que o teste de Stanford possa ser adotado rotineiramente em pontos de atendimento na maioria dos países porque requer uma pequena amostra de sangue e leva de 30 a 45 minutos para ser realizado e fornecer o resultado.
Uso excessivo de antibióticos
De acordo com os autores, o diagnóstico precoce da infecção aguda tem consequências importantes para o resultado clínico, administração de antibióticos e alocação de recursos de saúde. No entanto, afirmam, a maioria dos pacientes com infecção aguda nunca recebe um diagnóstico microbiológico positivo.
Eles explicam que infecções sistêmicas agudas geralmente se apresentam com sinais e sintomas inespecíficos, mas as decisões sobre manejo clínico e tratamento muitas vezes são tomadas com base na apresentação clínica, na epidemiologia da região e em padrões clínicos locais de atendimento, o que leva à prescrição errônea de antibióticos, feita empiricamente em 30% a 75% dos pacientes com infecções virais – é o caso dos EUA, Canadá e Reino Unido. Em países de baixa e média renda, antibióticos são prescritos de forma inadequada para até 95% dos pacientes com infecções não bacterianas.
“Diagnosticar com precisão se um paciente tem uma infecção bacteriana ou viral é um dos maiores desafios globais hoje em dia”, conclui Purvesh Khatri.
O artigo A robust host-response-based signature distinguishes bacterial and viral infections across diverse global populations foi publicado em 20 de dezembro de 2022 no periódico Cell Reports Medicine. (Com informações do Labnetwork – 06.01.22)