Um ano e três meses após a chegada da pandemia de Covid-19 no Brasil, a realidade na área médica é de profissionais exaustos física e emocionalmente, muitos apresentando sintomas da síndrome de Burnout – distúrbio psíquico causado pela exaustão extrema, relacionada ao trabalho. Além disso, faltam leitos, equipes, materiais básicos, há insuficiência de protocolos de segurança e qualidade, etc. Para completar, muitos tiveram que optar pela pejotização e agora outro fantasma surge para assombrá-los: a possibilidade da tributação sobre a distribuição de lucros e dividendos em 20%, retido na fonte.
O especialista Tiago Lázaro, CEO da Mitfokus, soluções financeiras e tecnológicas para área médica, explica que o novo pacote de medidas da Reforma Tributária, proposto pelo Executivo, propõe a tributação de dividendos como forma de reduzir a carga tributária das empresas. De fato, a proposta reduz a alíquota de 15% para 10% de IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica). Contudo, não altera a alíquota da CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido) e tributa os dividendos em 20%, distorcendo o fato de que a medida se propõe a simplificar a tributação e obrigações acessórias.
“Em termos gerais, a redução da carga tributária em alíquotas efetivas de uma empresa médica no regime do lucro presumido, com faturamento de 100 mil, ISS de 5%, e considerando que os sócios distribuem 60% da receita, diminuiria 1,6% da carga efetiva, tributando em 15,93% aproximadamente. E considerando a tributação dos dividendos, a carga tributária total (empresa + sócio), aumentaria para 27,93% se esta medida fosse colocada em prática. Desta forma, os médicos seriam duramente impactados com a nova forma de tributação, já que suas retiradas são feitas justamente dos lucros de seus negócios”, exemplifica.
Além disso, hoje os dividendos são isentos de tributo, justamente para evitar a dupla tributação, afinal, as empresas já pagam imposto sobre o lucro. E o lucro líquido, que dá origem à distribuição dos dividendos, é justamente a consequência dessa linhagem de tributos.
“Então, a nova proposta faz com que ocorra a bitributação, sendo que o lucro da empresa já é tributado e o dividendo tem um caráter distributivo. Com isso, 85% dos médicos serão impactados, já que a maioria trabalha como PJ (Pessoa Jurídica) hoje no Brasil”, afirma Tiago Lázaro.
Complexidade
A tributação dos dividendos agrava um problema que os médicos que trabalham sob regime pessoa jurídica já estão enfrentando: o emaranhado de regras do sistema tributário nacional, assinalado pela burocracia, onerosidade e complexidade – especialmente em relação aos tributos sobre bens e serviços, os quais têm regras próprias e requerem conhecimento intrínseco sobre as características de cada um deles.
“Os profissionais da saúde se sentem perdidos em meio a tantas regulações, que são dadas através de leis, decretos, instruções normativas e portarias emitidas nas três esferas de governo”, diz Lázaro.
Então, considerando que o Brasil possui 26 estados, mais o Distrito Federal, e 5.568 municípios, não é novidade que o médico seja surpreendido com multas e autuações das autoridades fiscais, conforme explica o advogado Lucas Souza, tributarista parceiro da Mitfokus:
“Em um ano, estamos sendo muito procurados por médicos PJs que foram autuados pelo fisco ou notificados de alguma cobrança, sendo que os passivos somam R$ 2 milhões.”
O cardiologista Dirceu Melo, de Valinhos (SP), é um dos profissionais que teve que recorrer judicialmente ao estranhar o atraso na chegada do boleto de pagamento do Imposto Sobre Serviços (ISS): “Eu consultei a Prefeitura para saber o que havia acontecido e fui surpreendido com uma autuação e cobrança retroativa de dois anos do tributo. Ocorre que eu cumpri pontualmente todas as minhas obrigações fiscais.”
Atuando em parceria, com um único Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), com uma médica intensivista, Dirceu conta que não se trata de uma sociedade empresarial, afinal, não há sede física. Sendo assim, o CNPJ só existe para que eles possam receber seus honorários. Então, mensalmente, como é devido, eles recolhiam o ISSQN (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza), de R$ 350 mensais, até serem pegos de surpresa com a mudança da alíquota de 3% do faturamento. “Agora, além da mudança retroativa, há também a multa. É injusto, sempre cumprimos com as nossas incumbências fiscais. Se mudou o enquadramento, é daqui por diante. Então, entramos com processo judicial para reverter o cenário”, informa.
Souza explica que a pejotização dos médicos passou a ser recorrente depois da publicação da Lei nº 13.429/2017, que alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), liberando a terceirização de quadros, inclusive para atividades finalísticas da empresa. Assim, muitos profissionais, em vez de serem admitidos pelo regime CLT, estão sendo contratados como pessoa jurídica. Com a pandemia, quando a demanda por médicos cresceu, a pejotização igualmente se ampliou.
Por fim, o CEO da Mitfokus, Tiago Lázaro, recomenda que, diante da alta complexidade do sistema tributário brasileiro e para evitar dores de cabeça, os médicos recorram ao auxílio de uma consultoria especializada: “O planejamento tributário se faz necessário para evitar que se pague mais impostos do que deveria e para realizar uma gestão eficiente de tributos. Conhecedora das particularidades do mercado da saúde, uma consultoria consegue identificar os caminhos a serem percorridos para que o profissional esteja em dia com suas obrigações fiscais, mas sem gastar além do que deve, nem ter problemas com multas e cobranças indevidas.” (Com informações da Engenharia de Comunicação – 13.07.21)